quarta-feira, 30 de abril de 2008

Grandes Trailers!



Before Sunset - Antes do Anoitecer (2004): Para além de nos deixar a salivar pelo visionamento do filme, este belo trailer alimenta a vontade de rever a obra original. Uma sessão dupla é o recomendado!




Little Children - Pecados Íntimos (2006): O ritmo vertiginoso do trailer é um assombro e propõe a ideia de uma "colisão" iminente para aquelas personagens.




Adaptation - Inadaptado (2002): A música escolhida e a construção algo frenética do trailer estão de acordo com a deliciosa encruzilhada emocional presente no filme.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Funny Games U.S. - Brincadeiras Perigosas (2007)

Instintos Fatais

Estranha sensação esta, a de revisitar as memórias, códigos e convulsões internas de um filme-farol imbuído de controvérsia, que marcou indelevelmente a década de 90. À partida, a ambição de Michael Haneke ( La Pianiste, Caché) em criar um remake shot-for-shot da sua própria fita de culto gerou alguns dissabores junto da comunidade cinéfila. Afinal, não seria um erro da parte do realizador querer repetir pormenorizadamente a abordagem a uma temática que já tinha sido escalpelizada de forma tão exímia, nos idos de 97? Será que corria o risco de cair num fatal exercício de modernização, boçalidade e redundância, daqueles que deixam máculas para toda uma carreira? Em abono da verdade, ambas as hipóteses poderiam ser perfeitamente validadas, tanto mais que ainda se tem em mente a péssima homenagem que Gus Van Sant prestou ao mestre do suspense Alfred Hitchcock em 1998, quando decidiu relançar (?) e actualizar (??) uma das suas obras-chave: Psycho. Mas neste caso específico, sabendo que no controlo encontrava-se Michael Haneke a reinventar Michael Haneke, as esperanças alcançaram novos horizontes e a promessa de uma obra de qualidade já se avistava ao longe.

E chega agora a confirmação plena! Funny Games é desde já um dos filmes maiores deste ano, uma certeza absoluta no que diz respeito ao talento sem fronteiras do realizador alemão e uma certificação da notável capacidade de se operar na perfeição sobre material já trabalhado (os resultados deviam ser sempre assim...). A premissa deste filme minimalista é lacónica: um casal e o seu filho menor dirigem-se para a pacata casa de férias, com o objectivo de aproveitar algum tempo de qualidade em ambiente familiar. Lá chegados, recebem de imediato a visita relâmpago de dois jovens aparentemente educados e respeitadores, cujas intenções não se conseguem vislumbrar ao certo. À medida que a interacção se vai desenrolando, os jovens começam-se a insinuar e a revelar a suas personalidades psicóticas, obrigando então a família a participar numa série de jogos maquiavélicos e doentios.

Com este projecto, Michael Haneke pega na sua agenda temática e faz questão de realçar novamente o modo como o medo e a violência são percepcionados nas sociedades contemporâneas (com uma pequena-grande ajuda por parte dos mass media), onde cada vez mais a realidade, a ficção e a componente de "fascínio culpado" se cruzam de forma indescritível. O realizador é um provocador por excelência, e parece não ter problemas com isso: basta entrar em contacto com a essência de alguns dos seus filmes para compreender isto rapidamente. Ele é alguém que formata as imagens de tal forma que pode dar a ver a mais cruel das perturbações íntimas com a maior das austeridades formais, criando um paradoxo arrepiante. Para lá desta forma de "trocadilho" visual, Haneke esforça-se sempre por manipular/seduzir/culpabilizar o espectador a seu bel-prazer, dando-lhe a certeza de que ele é um joguete nas suas mãos e incentivando-o a querer ver mais, para além dos limites auto-impostos. Assim, no seu cosmos particular, não só se colocam em cena as mais desconcertantes problemáticas da moral, como se impõe ainda à audiência um genuíno desafio à confrontação com os seus verdadeiros desejos.

Contando com um elenco, no mínimo, visceral (Naomi Watts, Tim Roth, Michael Pitt e Brady Corbet são assombrosos), o cineasta alemão consegue demonstrar que mesmo em modo auto-copista é capaz de atingir a magnificência cinematográfica. E de despertar os sentimentos brutais de outrora, que já se encontravam devidamente aplacados. Este seu esforço de transpor para a realidade americana o conteúdo chocante do filme original é de louvar, embora a recepção crítica não tenha sido de rasgados elogios. Mas também o que se pode esperar de um iconoclasta inconformado por natureza? Certamente que o consenso crítico não faz parte da lista.


Classificação: 5/5

terça-feira, 22 de abril de 2008

I'm Not There - Não Estou Aí (2007)

Os Fragmentos de Bob

Bob Dylan está aqui mas também não está. É o que apetece dizer depois de se estar em contacto com o mais recente projecto de Todd Haynes. De facto, Haynes confirma taxativamente que é alguém que não receia o lado experimental na sua peculiar cinematografia, e muito menos está disposto a deixar passar o comboio da originalidade. Transpor para um filme formalmente arriscado a personalidade complexa do músico Bob Dylan é como atirar um peixe para dentro de água: os 'conceitos' encaixam-se bem. Se ainda por cima tivermos em conta que para interpretar esta lenda viva do rock 'n' roll o realizador recorreu à ajuda de seis actores (entre eles uma mulher, fabulosa Cate Blanchett, e um jovem actor negro) o projecto assume ainda mais a sua condição bizarra. E a coisa resulta, se bem que não impressione por aí além...

I'm Not There (o título de um dos temas de Dylan) é a recriação da vida e obra do ícone, durante várias décadas e múltiplos estados de alma. Escalpeliza-se a aura mitológica, a atribulada intimidade da estrela, as suas origens e as nem sempre pacíficas relações com os media. Tudo com a cumplicidade vital desse pano de fundo que é a música (como não podia deixar de ser). Procurar aqui os traços típicos de um biopic é tarefa que não leva a bom porto, pois o filme aliena-se dessas estruturas convencionais e funde as diversas vinhetas como bem entende. Há avanços temporais, recuos bruscos e cabe aos espectadores a ingrata tarefa de juntar as peças do puzzle. O filme pede muita disponibilidade a quem o vê, para além do óbvio requisito de se conhecer minimamente o percurso artístico e pessoal da persona que aqui é retratada.

A alguns dos actores calhou-lhes na rifa mais sorte do que a outros, já que representam épocas que estão sobejamente consolidadas na memória popular. Cate Blanchett é quem mais se destaca não só por estar relacionada com este aspecto, mas por ter uma interpretação avassaladora e por ser... uma mulher! A actriz gere magistralmente bem a sua composição, sem se deixar influenciar pelas facilidades dos maneirismos. Quando ela surge no ecrã, acreditamos piamente que é Bob Dylan que ali está materializado. Esta opção de carreira poderia prejudicar-lhe caso o saldo não fosse muito estimulante, mas não há nada a temer: Blanchett não só dá conta do recado como também arranca a melhor performance do filme. Christian Bale e Heath Ledger (num dos seus últimos papéis) encontram-se também eles a voar a alto nível.

Se ao nível do cast e da organização formal o resultado prima pela excelência, já no que diz respeito à construção dramática as coisas não são tão brilhantes. O esforço por uma constante originalidade trai um pouco a essência apelativa do filme, já que, a espaços, o ritmo quebra-se e a atenção dispersa-se. Como já referi em cima, I'm Not There pede muita disponibilidade, e o factor 'duração' também não ajuda (são mais ou menos 2h15 de fita, com algumas partes dramaticamente redundantes, para ser sincero). No geral, o filme é prolixo, nunca dando a conhecer o verdadeiro Bob Dylan, apenas os seus traços de personalidade. Por isso mesmo, esta é uma daquelas fitas de construção individual, que será percepcionada de diversas formas pelos diferentes espectadores; cada visionamento será único e susceptível de alterar a opinião formada anteriormente. Está-se, portanto, numa interessante matriz de mutação que se correlaciona com a(s) faceta(s) do insondável artista...


Classificação: 3/5

quinta-feira, 17 de abril de 2008

American Psycho (2000)

O Exterminador Implacável

Anos 80. Essa década marcada pela gestão de Reagan será para sempre recordada como o zénite do excesso, o cume do consumo desenfreado. Nesse período da moral corrompida movimentavam-se predadores como Patrick Bateman, a figura nuclear do livro de Bret Easton Ellis. A realizadora Mary Harron soube ver o potencial desse marco literário e decidiu pegar na controversa obra de culto, adaptando-a para o cinema no ano 2000. O resultado? Muito bom, embora em Portugal a coisa não tenha sido lá muito estimulante: o filme chegou bastante atrasado às salas e a recepção por parte do público marcou-se, mais ou menos, pela indiferença.

American Psycho é um thriller carregado de sarcasmo e humor negro, que se passeia pelo cosmos da alta sociedade nova-iorquina. É lá que encontramos Bateman, um bem sucedido yuppie de Wall Street, dono de uma vida aparentemente glamourosa. Nada é deixado ao acaso na existência do senhor: a casa é luxuosa, os fatos são da mais pura alta-costura, o acesso a restaurantes da moda é fundamental e o tratamento excessivo do corpo uma necessidade básica. Solitário e narcisista, Bateman entra em disputa com os seus colegas de trabalho para averiguar qual deles possui... o mais requintado cartão de contacto! Entre a sua namorada loura e oca (que desconhece o verdadeiro "eu" do seu mais que tudo) e a sua amante viciada em drogas, o jovem dedica-se a um "desporto" repleto de rituais muito atípicos: mata prostitutas de rua, desalojados e companheiros de profissão que não suporta. Tudo com o maior dos preparos e enquanto disserta sobre os artistas e hits do momento que mais aprecia...

O filme é uma provocação de uma ponta à outra. É uma sátira elegante, inteligente e misógina até ao tutano sobre a convulsão interna de uma classe social alienada e hedonista onde a moral e a ética constituem conceitos vagos. Para além da excelente revisitação dos comportamentos superficiais e paisagens da época, Mary Harron propõe um brutal estudo da crueza inerente à sua personagem principal, o serial killer que apresenta a sua metodologia tirana como algo natural dado o contexto em que habita. De facto, a psique distorcida e as acções sádicas de Patrick Bateman mais parecem um prolongamento empolado daquilo que se passa na arena social e profissional onde ele se tenta impor constantemente.

Tenho pena de confessar isto, mas a performance de Christian Bale é que já não me convenceu por aí além. Se é verdade que há momentos em que o actor atinge a excelência dramática, também é certo que existem tantos outros onde a sua interpretação se torna algo "postiça". Não nego que o filme puxa por esse lado over the top, mas isso não significa que o actor tenha de entrar a maior parte do tempo nos portais do excesso (mesmo que se compreenda que queira estar em consonância com o espírito da narrativa). Ainda assim, não é este factor que diminui a qualidade geral da obra.

Saúdo sim é o fabuloso final, uma espécie de anti-climax que desvenda o desnorteamento a todos os níveis do tresloucado empresário. Pode não agradar a todos (há quem o ache patético), mas continuo a considerar que essa conclusão condimenta na perfeição um filme que, não sendo brilhante, constitui um irrecusável objecto de cinema.


Classificação: 4/5

quarta-feira, 16 de abril de 2008

TOP 5 Jim Carrey

1) Man On The Moon (1999)

2) Eternal Sunshine Of The Spotless Mind (2004)


3) The Majestic (2001)


4) The Cable Guy - O Melga (1996)


5) The Truman Show (1998)

segunda-feira, 14 de abril de 2008

My Blueberry Nights - O Sabor do Amor (2006)

O Amor é um Lugar Estranho

Wong Kar-Wai, esse magnífico cineasta de origem chinesa que nos presenteou com pérolas inolvidáveis como Chungking Express e In The Mood For Love, espalhou-se ao comprido com o seu primeiro trabalho falado em inglês e rodado totalmente nos EUA. Se pensarmos bem, chega a ser desolador que isto tenha acontecido, quando na verdade a comunidade cinéfila torcia pela qualidade do filme e Kar-Wai parecia contar com todos os elementos (técnicos e humanos) para criar algo memorável. Mas não, aqui a aposta saiu furada, para mal dos nossos pecados.

Estamos perante um conto urbano-onírico de travo anímico sobre uma jovem mulher que, após um desgosto amoroso, se lança pela estrada fora, em busca de algumas respostas para as encruzilhadas da vida. Nessa travessia que se revela física, psicológica e afectivamente fulcral, a rapariga cruza-se com uma panóplia de personagens excêntricas que, involuntariamente, lhe fornecem algumas pequenas lições que a ajudarão a saciar as suas hesitações emocionais.

My Blueberry Nights conta com o primeiro trabalho de Norah Jones nos domínios da representação, e em abono da verdade a cantora não se sai nada mal. Mas também é certo que ela não tem muito para fazer. Como o filme possui um traço de terapia confessional, Jones vê a sua relevância a diminuir conforme vai interagindo com as outras personagens. O cast é sublime (Natalie Portman, Jude Law, Rachel Weisz e David Strathairn), mas inacreditavelmente nenhum deles faz um brilharete como é costume. Isto prende-se com o facto do argumento e das diversas resoluções dramáticas apresentarem uma grave falha ao nível da vibração emocional. O filme quer ser tão aprumadinho que se torna, afinal, em algo insosso e rebuscado. Depois, determinados diálogos também não ajudam à festa, uma vez que caem numa redundância tal que chegam a parecer oriundos de uma muito duvidosa filosofia de pacotilha.

A ideia que transparece é a de um portfolio de vinhetas prosaicas e pouco empolgantes em que Kar-Wai encerra um curioso paradoxo: ao querer copiar o melhor de si próprio, das suas marcas autorais, o realizador acaba por reflectir o seu pior. Mais parecendo uma curta-metragem esticada até ao limite, My Blueberry Nights quase descamba em terrenos fedúncios, tal a falta de carnalidade e de conclusões interessantes. Até a questão da própria viagem (que deveria ser um dos zénites do filme) é algo pífia, porque nunca se sente o peso dessa jornada nem a real importância que ela tem para a protagonista.

A estética arty de Kar-Wai está lá a marcar presença (valha-nos isso), com todo o cromatismo e jogo de luzes que lhe reconhecemos, mas isso não é suficiente para remediar um filme que soa demasiado a ingénuo. E que subaproveita os belos actores que tem sob a sua alçada. Definitivamente, as tartes de mirtilo devem saber bem melhor.


Classificação: 1/5

quinta-feira, 10 de abril de 2008

Marie Antoinette (2006)

A Rainha do Povo

Que Sofia Coppola é um dos maiores talentos da sua árvore genealógica, disso não tenho as mínimas dúvidas. Há alguns anos que a talentosa argumentista e realizadora acalentava o desejo de criar um filme sobre a trágica Marie Antoinette, a jovem e terrible monarca de França (ao que parece, enquanto estava enredada na escrita deste projecto, Sofia começou a desenvolver uma obra que viria a ser o sucesso de crítica e público Lost In Translation). Quando finalmente surgiu a incrível permissão para filmar no interior do Palácio de Versalhes, as estrelas da sorte estavam como que alinhadas para a benção de algo que se acreditava ser inesquecível. Mas o saldo acabou por não ser tão entusiasmante. Acontece que, aquando da estreia do filme no Festival de Cannes, as críticas foram tudo menos entustiásticas, algumas até maldosas dizendo que a realizadora tinha perdido parte do encanto e originalidade que demonstrara nas obras anteriores.

Para elaborar o seu sonho, Sofia baseou-se livremente na polémica biografia da historiadora Antonia Frasier e interpretou o que absorveu. Por isso, para os puristas dos retratos históricos fica o conselho: procurar verosimilhança absoluta no que nos é apresentado não só se revela um erro crasso (contas feitas, a Marie Antoinette de Kirsten Dunst usa ténis Converse All Star, o que diz tudo) como também um simplismo na abordagem a este tipo de obra (lá por se adaptar a trajectória pessoal de uma figura icónica não significa que não se possa reinventar ou modernizar esse percurso, para estar em consonância com a visão de quem avança com o projecto).

Esta fábula feminista invoca então o espírito de Marie Antoinette (filha do imperador austríaco François I) que, ainda em plena adolescência, se vê obrigada a abandonar a sua Áustria Natal e partir rumo a Paris, para se casar com o futuro Rei de França, Louis XVI. A sua chegada à Corte Imperial marca o início da aliança franco-austríaca mas vai despoletar uma série de escandâlos que farão com que a jovem Marie Antoinette não seja muito bem vista nem aos olhos da monarquia reinante, nem do próprio povo francês. Kirsten Dunst foi a escolha da realizadora para encarnar a monarca rebelde, uma vez que a parceria entre ambas resultou magistralmente na longa-metragem inaugural de Sofia (The Virgin Suicides). Dunst, uma das actrizes mais resplandecentes da sua geração, faz muito com o pouco material dramático à sua disposição e não é certamente por culpa dela que o filme não resulta.

O problema reside na aposta numa grandiloquência a nível formal em detrimento de uma coerência narrativa. Nesse sentido, temos um filme plasticamente belo, glamouroso e com trejeitos de videoclip pop-rock, mas irritantemente parco em substância dramática. Falta a Marie Antoinette a perturbação emocional e a dimensão trágica que nos faria assimilar a tremenda injustiça a que aquela mulher foi sujeita. Apenas me marcaram duas cenas em que compreendemos a profundidade da personagem: quando recebe a destruidora carta da mãe e quando passeia com os filhos pelos jardins. De resto, Marie é basicamente uma top-model pueril, iníqua, viciada em doces e em constante movimento, como que a querer dar a falsa ilusão de que se está a passar muita coisa a nível dos sentimentos. Nada mais errado: o que se transmite na verdade é a total sensação de futilidade e inocuidade.

O mais frustrante é que a ideia-raíz de Sofia é fabulosa, um pouco na linha do que já tinha feito nos seus outros filmes. O olhar triste sobre a solidão na adolescência, o desespero de não se fazer compreender, a melancolia que o contexto tem sobre nós e o vazio existencial são vectores que, bem explorados, poderiam ter desaguado num biopic radical, mas tematicamente complexo. Infelizmente, nada disso acontece devido ao tal dispositivo dramático insuficiente. Depois, surge um outro erro gritante que é a marginalização das personagens secundárias; ao não terem tempo de antena, resumem-se apenas a adereços maravilhosamente vestidos e maquilhados, mas com uma espessura humana comparável a uma folha de papel.

Tiro o chapéu à espantosa fotografia e à coragem pela introdução de uma banda-sonora anacrónica (com nomes sonantes como The Cure, New Order e The Strokes), sendo que esta última decisão criativa é uma das tiradas mais majestosas de todo o projecto. Com essa opção, o que o filme faz é modernizar Marie Antoinette, trazendo-a para o contemporâneo e traçando um interessante paralelo com todas as mulheres que continuam a sofrer inúmeras opressões vindas de uma qualquer sociedade moralmente obsoleta e decadente. Tenho mesmo imensa pena do desperdício de valores que representa este filme, tanto mais por realmente compreender a mensagem que a realizadora quis passar. Enfim, depois deste tropeçar só nos resta esperar que venham melhores dias para a filha de Francis Ford Coppola... Vamos fazer figas!


Classificação: 2/5

terça-feira, 8 de abril de 2008

Velvet Goldmine (1998)

Quem Tramou Brian Slade?

Todd Haynes parece caminhar cada vez mais no sentido de se tornar um expert no capturar da essência de diversas eras. Em Veneno e Seguro, o realizador remetia-nos para os diversos problemas que assolam a sociedade contemporânea; em Longe do Paraíso, encenou um passeio elegante e triste aos melodramas de recorte clássico (típicos dos anos 50), fazendo a devida vénia ao intemporal Douglas Sirk; na sua mais recente obra, I'm Not There, Haynes propõe a revisitação da mitologia desse enigma criativo que é Bob Dylan. Como não podia deixar de ser, Velvet Goldmine também não foge a esta "regra" cinematográfica, em que o experimentalismo parece estar sempre presente.

O filme de 1998 transporta-nos para os atribulados anos 70, em que a cultura do Glam Rock vivia os seus dias de expressão máxima. O excesso era a palavra dominante e Brian Slade um dos ícones musicais que incorporava esse espírito kitsch. Com uma ascensão meteórica e a fama a seus pés, Slade vê a sua jornada terminar repentinamente com um atentado durante um espectáculo. Uma década depois, um jornalista é destacado para averiguar o que realmente aconteceu à estrela de outrora... Velvet Goldmine é um interessantíssimo exercício de nostalgia que evoca uma era de todas as possibilidades, de todas as afirmações individuais e sociais. Cruzando o registo de reportagem-ficcionada com o formato de videoclip pop-rock, Haynes conta uma história desencantada e algo feérica sobre as ambiguidades do desejo, que absorve literalmente o modus operandi dos filmes da década de 70 (o foco nas expressões faciais, que era uma verdadeira obsessão nas obras dessa época, está lá todo). O realizador explora o cáustico processo da fama, as teias da provocação enquanto ferramentas de modificação da ordem social e ainda a melancolia da memória/percepção.

Com todos estes recursos disponíveis por desbravar, sobra ainda tempo para trazer à superfície a estrutura de Citizen Kane e relembrar a mitologia de lendas vivas como David Bowie e Iggy Pop. O resultado prima pela excelência, e os actores não fogem a esse padrão. Especialmente Toni Collette, que tem uma interpretação avassaladora: a actriz é arrepiante na materialização cristalina de uma mulher traída pelos valores flutuantes de uma época que abraçou sem hesitações. Um "teatro musical" muito provocador, excêntrico, mas também de grande qualidade.


Classificação: 4,5/5

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Keanu Reeves e o Repetir a Química...



Com Sandra Bullock em Speed (1994) e A Casa da Lagoa (2006)




Com Charlize Theron em O Advogado do Diabo (1997) e Doce Novembro (2001)




Com Rachel Weisz em Perseguição Diabólica (1996) e Constantine (2005)

quinta-feira, 3 de abril de 2008

The Mist - Nevoeiro Misterioso (2007)

Vieram do outro Mundo...

Uma pacata vila costeira é atacada por um súbito nevoeiro, após uma noite de intensa tempestade. Enquanto estão no supermercado local a fazer as habituais compras, um grupo de residentes da pequena comunidade apercebe-se da investida de uma estranha neblina. O pior é que nesse alastrar de nevoeiro escondem-se algumas criaturas de aspecto alienígena, com uma tremenda eficácia no extermínio de humanos. Como a massa atmosférica não consegue irromper pelos recintos fechados, os habitantes da vila vêm-se obrigados a permanecer no interior da superfície comercial, gerando-se assim um clima de paranóia e medo que não perde em nada na comparação com o que se passa lá fora.

Frank Darabont, o mítico realizador de Os Condenados de Shawshank, adapta mais uma vez uma obra do mestre do terror Stephen King (À Espera de um Milagre, com Tom Hanks, foi a outra adaptação de Darabont). E, verdade seja dita, não se sai nada mal. The Mist (que recicla o medo proporcionado por The Fog e The Thing, ambos de John Carpenter), enfatiza o modelo de terror clássico, em que o foco está todo direccionado para o seio das reacções/relações humanas. Mais fascinante do que a ameaça que despoleta a narrativa é o efeito que essa "sombra" pouco perceptível possui nas pessoas que a estão a viver. É verdadeiramente estimulante assistir a um bom filme que se serve dos mais actuais recursos tecnológicos para contar uma história com pés e cabeça, em vez de submeter o argumento a uma parafernália de efeitos especiais sem alma. Embora The Mist não concentre uma imensa qualidade no que diz respeito a essa manipulação digital de imagens, a verdade é que a competência do dispositivo dramático quase nos faz esquecer esse pormenor, tornando-se quase redundante o apuro visual.

Na suposta aparência de uma banal fita de horror, esconde-se afinal um filme muito decente que abarca genialmente outros géneros, funcionando tudo às mil maravilhas. O medo está lá todo, quer seja perpetuado pela ameaça exterior ou pela irracionalidade da natureza humana (tal como em The Thing, não sabemos qual das duas opções nos aterroriza mais). Temas como a paternidade, o fanatismo religioso, a perda das regras sociais perante uma situação de crise extrema e o poder da paranóia colectiva aglutinam-se na agenda de um género que nem sempre se tem pautado por resultados brilhantes. Juntamente com a sobriedade da realização (aquela passagem de cenas destila old school por todos os poros) encontra-se a solidez do elenco, que eleva a qualidade das interpretações para um filme com esta temática. Especial destaque vai para Marcia Gay Harden, essa eterna secundária de luxo que nos manipula os nervos na pele da tresloucada religiosa, pronta a relatar as profecias da desgraça a todos os que lhe dêem a mínima atenção.

O fabuloso final é simplesmente dos melhores com que me deparei nos últimos tempos: a sua brutalidade, que encerra uma total falta de esperança e puro desencanto, acompanha-nos depois de sairmos da sala e faz-nos crer que este não é daqueles filmes que esquecemos facilmente assim que acabam.


Classificação: 4/5